Matéria da Folha de S. Paulo, com a participação do especialista em Direito Digital, Dr. José Milagre, sobre os pontos positivos e negativos do projeto de Lei das Fakenews (PL 2630/2020).

A Folha de São Paulo selecionou 24 especialistas para que avaliassem o Projeto de Lei das Fakenews em trâmite no Congresso Nacional, em diversos pontos, e apresentassem sua opinião. Após, condensaram todas as análises e fizeram esta importante matéria, que retrata pontos de consenso e riscos, matéria profunda elaborada pela Jornalista Renata Galf.

É um debate que interessa não só a comunidade de especialistas em Sociedade, Direito e Tecnologia, mas a todos!

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/08/lei-das-fake-news-pode-ser-util-mas-especialistas-pedem-cautela-ao-congresso.shtml



Golpe que promete alta rentabilidade em Bitcoins

Tem crescido o golpe digital das falsas “trade forex, binary e cryptocurrencies”, no qual os bandidos digitais monitoram redes sociais e grupos de investidores e fazem amizade ou contato com potenciais vítimas para aplicar o golpe. Comumente chegam às vítimas preferenciais com base em postagens das próprias “presas”, que indicam se elas possuem algum patrimônio ou valor a investir. 

Aí vem a “engenharia social” ou a arte de “enganar pessoas”, os criminosos, fazem um contato com a vítima, prometendo altíssima rentabilidade para seu dinheiro. Para tanto, conduzem a vítima a criar uma conta em uma corretora de bitcoins e comprá-los. Neste momento, para ganharem confiança, pedem que a pessoa acesse o “site” da corretora, que é um site falso, e a induzem a criar uma conta e depositar apenas um pequeno valor para ver a rentabilidade. Assim é feito, em questão de dias os valores em bitcoins rendem 5 a 10% na “conta virtual”, o que “desarma” o investidor, fazendo com que este transfira grandes quantias de criptomoedas para a corretora falsa.

Assim, os criminosos mantêm o painel por aproximadamente 30 (trinta) dias, com simulações falsas de rentabilidade. As vítimas demoram até 60 (sessenta) dias para descobrirem e só percebem quando solicitam o “resgate do investimento”. Então, começam as desculpas, as evasivas, até que chega um momento em que a corretora simplesmente some, para de responder, tira o site do ar (site, aliás, registrado anonimamente) e o golpe se consuma.

Geralmente, a vítima tem pouquíssimos registros, não consegue mais acesso ao seu “painel administrativo” no site falso da corretora e pode ter apenas alguns prints dos endereços de destino dos bitcoins, registrados na sua própria corretora.

É possível investigar e rastrear o dinheiro, porém, não significa necessariamente saber quem está por trás de uma carteira eletrônica. Isso vai depender da cooperação da exchange, wallets e aplicações. Não é um procedimento simples e rápido e pode envolver outros continentes. A recomendação para quem é vítima é preservar todas as mensagens e contatos recebidos e imediatamente buscar apoio para apuração da identidade dos fraudadores. Ainda que o número de WhatsApp usado para mensagens pelo fraudador seja internacional, a rede guarda registros de aplicação, o que pode indicar pessoas do Brasil, apenas usando um número internacional para dificultar a apuração da autoria.

O golpe tem se mostrado extremamente eficaz tendo em vista o momento ruim dos investimentos no Brasil, sobretudo em renda fixa, onde pessoas físicas buscam alternativas na Bolsa de Valores e nas Criptomoedas.

Para não se tornar mais uma vítima, basta uma simples pesquisa no Google para se ter uma dimensão se a corretora tem boa reputação ou é um scammer (qualquer esquema ou ação enganosa e/ou fraudulenta que, normalmente, tem como finalidade obter vantagens financeiras). Um site muito útil é o https://www.scamadviser.com/ responsável por checar qualquer site indicado e pode informar se trata de um site confiável ou não, muitas vezes indicando se o site oferece serviços de criptomoedas de alto risco. Se o risco apontado pelo ScamAdviser for alto, fuja! E mais uma dica: jamais revele seus investimentos em redes sociais! 




Matéria na versão impressa e digital da Folha de S. Paulo, com a participação do especialista em Direito Digital, Dr. José Milagre, sobre o Registro da Cadeia de Encaminhamentos do WhatsApp, previsto no Projeto de Lei das Fakenews (PL 2630/2020).

Uma das matérias mais profundas sobre este tema, que pode vir a ameaçar toda a construção de direitos e garantias a todos os usuários de Internet do Brasil.

Quer saber mais detalhes, então acesse https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/07/regra-para-armazenar-cadeia-de-mensagens-do-whatsapp-pode-ser-ineficaz-em-projeto-de-fake-news-no-congresso.shtml e fique por dentro!




Como é a atuação do advogado especialista em crimes cibernéticos?

O exercício da Advocacia especializada em crimes virtuais vem chamando a atenção de inúmeros profissionais e alguns fatores são considerados chave, como o crescimento das fraudes, golpes e ofensas praticadas pela internet.

O número de crimes virtuais vem crescendo desenfreadamente em todo o mundo. No Brasil não é diferente. De acordo com um relatório global publicado pela Symantec, o Brasil é o terceiro país que mais recebe ataques cibernéticos em dispositivos conectados à internet, considerando que de todas as ameaças detectadas, 9,8% ocorreram no Brasil, que fica atrás apenas dos Estados Unidos, com 10,1% e da China com 24%.

A quantidade de denúncias de crimes na internet cresceu 109,5% em 2018, segundo a associação SaferNet Brasil. A popularização do uso das redes sociais e das tecnologias, além do natural aumento da superexposição, aliada a ausência de programas de educação digital, favorecem igualmente o surgimento de golpistas e exploradores digitais.

Casos comuns de atuação

A atuação deste profissional é variada, podendo atuar em casos de perseguição virtual, stalking, crimes contra a honra, calúnia, injúria, difamação, cyberbullying e até em crimes eleitorais. Para se ter uma ideia, de acordo com uma pesquisa realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), ao analisar trinta países, chega-se a conclusão que um em cada três jovens foram vítimas de cyberbullying e muitos relataram que abandonaram a escola devido essas violências virtuais. 

No aspecto patrimonial, crescem os delitos de estelionato digital e furto mediante fraude. Alguns exemplos recentes foram os casos de golpes envolvendo o auxílio emergencial destinado a trabalhadores informais e autônomos neste momento de pandemia do Covid-19, que chegaram a atingir 7 milhões de pessoas no Brasil, segundo os dados da PSafe.

Outras técnicas utilizadas, como chip swap, vem permitindo que atacantes tomem posse de ativos digitais das vítimas, incluindo contas bancárias e a partir delas conseguem realizar saques em ativos ou solicitar empréstimos. 

Por falar em crimes patrimoniais, é impossível que o advogado especialista em crimes virtuais não lide com pelo menos um caso de extorsão online. Cresceram os casos de ransomwares, nos quais os atacantes criptografam os discos da vítima, bloqueando seus dados, solicitando resgate, normalmente em bitcoins, para que os dados sejam liberados. De acordo com os dados da Emsisoft, empresa de segurança especializada no atendimento a casos desse tipo, houve um aumento de 41% nas infecções por malwares que sequestram computadores e redes em 2019, sendo que 205,2 mil organizações foram vítimas de ataques desse tipo, com uma média de US$ 84,1 mil nos valores do resgate. 

Além disso, o phishing scam, que consiste na tentativa de fraudulenta de “pescar” (a palavra phishing, deriva do inglê fishing) informações confidenciais, através de mensagens aparentemente reais para obter, por exemplo, dados bancários, continua em alta e lesando inúmeras pessoas em todo Brasil. 

São diários os casos envolvendo crimes de pornografia infantil, onde o profissional precisa adotar procedimentos ágeis para cessar o conteúdo, impedir o constrangimento e muitas vezes apurar a autoria. Além disso, este profissional atua para empresas em questões envolvendo ataques direcionados, ataques de negação de serviços, invasões e até mesmo em questões envolvendo propriedade intelectual e softwares irregulares no ambiente corporativo, que também podem caracterizar condutas criminosas. 

O Advogado especialista em crimes cibernéticos também vai lidar constantemente com processos de apuração de autoria, bloqueios de conteúdos e aprenderá logo cedo a lidar com a resistência das empresas e algumas redes sociais em cumprirem ordens expedidas por juízes do Brasil, como aplicativos de mensagens, dentre outros. A base para a guarda de registros é o Marco Civil da Internet, Lei 12.965/2014, legislação basilar para quem atua na área. 

Ainda, em alguns casos, muitas vezes precisará do MLAT (mutual legal assistance treaty) para obter registros de provedores de aplicações sem sede ou localização no Brasil. 

Formação desejada

Como se pode verificar, atuar como advogado especialista em crimes virtuais exige, logicamente, conhecimento em tecnologia da informação, compreensão das principais técnicas utilizadas pelos atacantes para lesar e praticar crimes pela internet e conhecimento de procedimentos para apuração da autoria, já que em parte dos crimes cibernéticos que se apresentam, não se conhece, a princípio, os autores por trás da ofensa. 

Assim, não se pode afirmar que um profissional sem background técnico atuará com a mesma precisão de alguém que se dedica para ter uma complementação na carreira e mais afinidade com a informática. Por outro lado, isso  não significa uma graduação em tecnologia, já que, hoje, muitos treinamentos e cursos de extensão são úteis e recomendados, como o curso de perícia forense digital (https://bityli.com/9Jyef) que ministro para muitos advogados que atuam com direito digital, que participam com o escopo de compreender melhor os processos de apuração de autoria, quebra de sigilo, investigação informática, recuperação e preservação de evidências. 

Dentre as competências esperadas pelo especialista em crimes cibernéticos, encontram-se a produção da prova digital, compreensão das técnicas de ataques digitais, fundamentos de redes e sistemas operacionais, entendimento sobre principais vulnerabilidades web, dentre outras. 

Em meu livro, Manual de Crimes Informáticos (https://cutt.ly/ooMiv16) trato das 10 vulnerabilidades OWASP, instituição que apresenta as principais e mais sérias vulnerabilidades em aplicações WEB. Atualize-se nestas técnicas. 

Assistência técnica da Perícia em Informática

Ao longo de anos atuando com perícias e assistência técnica especializada em crimes informáticos, percebo cada vez mais a importância, seja na acusação ou na defesa, da figura do assistente técnico, profissional de tecnologia da informação, comumente especializado em perícia forense digital, para auxiliar tecnicamente o trabalho do profissional do direito ou penalista especialista em crimes virtuais. 

Este perito digital auxiliará em diversos momentos, desde inquéritos policiais, nas delegacias ou especializadas, na instrução, na formulação de quesitos, acompanhamento de exames técnicos e outras diligências, inclusive, avaliando os exames dos peritos oficiais e identificando falhas e omissões.  Também pode atuar dando suporte ao advogado para redação das teses e na produção de provas técnicas simplificadas. 

Tendências e como começar?

Furto de criptomoedas, pontos de milhagem, ativos virtuais, questões envolvendo jogos online e extraterritorialidade, atuação de bots na seara eleitoral, deep fakes, fake nudes dentre outras questões que surgem diariamente no mundo da Internet e tecnologia da informação, continuarão a crescer e demandarão ainda mais da atuação do profissional especializado em crimes cibernéticos. 

A cada dia novos jogos, aplicativos, técnicas e práticas se revelam verdadeiros perigos da internet. Os novos regulamentos de proteção de dados, como a LGPD e GDPR também estabelecem direitos aos titulares de dados e aumentam a preocupação de agentes de tratamentos com invasões e outros ataques e suas consequências, o que também abrirá um novo campo de mercado para os profissionais que se especializarem em crimes digitais.

Nos Estados Unidos, a atual preocupação passa a ser os crimes tributários e lavagem de dinheiro com criptoativos, nos quais inúmeros profissionais em crimes cibernéticos e lawtechs já atuam na investigação, perícia e defesa em casos desta natureza.  

Assim, o advogado especializado em crimes cibernéticos deverá estar em constante atualização, aprendendo conceitos de segurança da informação, principais formas de ataques e ameaças, estar bem assessorado tecnicamente por peritos e especialistas em tecnologia. Investir em aprimoramento é essencial e o diferencial entre profissionais que buscam, cada vez mais, atuar nesta promissora área do direito digital. Do mesmo modo que a sociedade migrou para a tecnologia, o crime também migrou e é neste contexto que o advogado em crimes cibernéticos apresenta um papel social relevante, como profissional fundamental na busca pela justiça, nos milhares de processos criminais envolvendo questões tecnológicas, que crescem a cada dia. 

Quer compreender melhor os processos de apuração de autoria, quebra de sigilo, investigação informática, recuperação e preservação de evidências? Então se inscreva no Curso de Perícia Digital e Investigação Forense Digital, que apresenta uma abordagem 360º sobre o tema que visa preparar profissionais para este novo mercado de trabalho através de técnicas e melhores práticas, para que possam atuar com segurança nas mais variadas frentes da perícia voltada à tecnologia da informação. Faça sua inscrição através do link https://bityli.com/9Jyef e fique por dentro!




As nebulosidades e riscos do art. 10 do Projeto de Lei das Fake News

O registro de encaminhamento de mensagens efetivamente contribuirá para o combate a crimes digitais e Fake News?

Aprovado no Senado o Projeto de Lei 2.630/2020, que trata do combate a Fake News, por 44 votos a 32. A matéria, no entanto, causou controvérsia, sobretudo no seu artigo 10, que obriga os aplicativos, como o WhatsApp, a registrarem os encaminhamentos de mensagens realizadas, rastreando o que alguém envia para outrem. Mas será que este artigo é fundamental para o combate a crimes digitais e Fake News?

Muitos mensageiros privados já informam medidas para combate às Fake News em tempos de pandemia. O WhatsApp, por exemplo, anuncia em suas políticas sobre limites de encaminhamentos de conversas:  “Para tornar o WhatsApp ainda mais pessoal, criamos o conceito de mensagens encaminhadas muitas vezes e adicionamos uma etiqueta de setas duplas para indicar que essas mensagens não foram criadas pelo contato que as enviou. Geralmente, as mensagens encaminhadas muitas vezes podem conter informações falsas e não são tão pessoais quanto as mensagens típicas enviadas pelos seus contatos no WhatsApp. Agora, atualizamos o limite de encaminhamento para que essas mensagens só possam ser encaminhadas para uma conversa por vez.”

Informa que as mensagens de WhatsApp já possuem um contador que registra quantas vezes a mensagem é encaminhada, informando ainda que o contador também é protegido pela criptografia ponta a ponta, e somente o aparelho do usuário e destinatário possui. O App alega que “não tem acesso a quantas vezes uma mensagem foi encaminhada”. Se esta tese for verdadeira, o próprio app no aparelho armazena a contagem e diante de número elevado aciona uma função condicional, limitando a possibilidade de encaminhamento. 

O artigo 10, no entanto, determina que os serviços de comunicação instantânea devam guardar os chamados “registros de encaminhamento”, o que vem sendo considerado uma “tornozeleira digital” pelos provedores de aplicação e um grande retrocesso. Basicamente, os provedores de aplicação deverão registrar metadados, “dados sobre dados”, relativos aos envios de mensagens veiculadas em encaminhamentos em massa, custodiando estes registros por três meses. A argumentação aqui é que se possa chegar à averiguação da origem de uma Fake News. Será?

O que se pretende guardar aqui seria, em nossa visão, data, hora, número/terminal ou Ids envolvidos nos envios, fuso horário e quantitativo total dos usuários que receberam a mensagem. Assim, a partir de uma mensagem recebida ou descoberta pela vítima, se poderia, com base na Lei Projetada (Lei Brasileira de Liberdade Responsabilidade e Transparência na Internet) requerer uma ordem judicial para que o mensageiro apresentasse, judicialmente, o registro de todos os encaminhamentos (cadeia de encaminhamentos), desde o primeiro existente no período de guarda, contanto que a mensagem deve se enquadrar nos critérios que obrigam o armazenamento, previstos em lei. Caso negativo, o provedor de aplicações deverá, em tese, justificar em juízo o não fornecimento. Quais critérios são esses?

Não se busca aqui, como visto, o conteúdo das mensagens e a princípio não se identifica os destinatários das mensagens. Faltava, no entanto, definir o que seriam os chamados “encaminhamentos em massa”. Na PL, ficou definido como o envio de uma “mesma mensagem”, por mais de 5 (cinco) usuários em intervalo de até 15 (quinze) dias, para grupos de conversas, lista de transmissão ou mecanismos similares de agrupamentos de múltiplos signatários, sendo obrigado a guardar apenas as mensagens que alcançarem 1.000 ou mais usuários. O acesso, só deve se dar por ordem judicial. A questão é, como a suposta vítima vai saber se a  “notícia falsa” está inserida no contexto de um encaminhamento em massa? Quais são os critérios para identificá-las? Uma mensagem pode não ter alcançado 1.000 usuários em uma semana, e na outra sim… Assim, na dúvida, resta indisfarçável que se este artigo calhar, muitas supostas vítimas irão pedir tais registros ao Judiciário, mesmo sem saber se trata de encaminhamento em massa, e isso pode gerar um aumento considerável de processos e requerimentos. O Judiciário deverá ser muito criterioso nas análises. As aplicações se recusarão a fornecer dados informando que não há registros para a mensagem, pois não atingiu os critérios legais para armazenamento. 

O artigo 10 foi aprovado no Senado, mesmo com destaque em sentido contrário, rejeitado, onde alguns Senadores entenderam que o “registro de encaminhamento” é essencial (pedra de toque) para apuração das Fake News, o que não é uma verdade técnica. O Marco Civil já prevê a guarda dos registros de acesso à aplicação (data, hora, ip e fuso horário) e que já são suficientes para a apuração da autoria de Fake News nos comunicadores instantâneos, ainda que em uma sequência de investigações mais demorada. Deste modo, não se trata de mais textos legislativos, mas de efetiva cooperação das aplicações no cumprimento da legislação já existente. 

De outra ordem, existem vários meios técnicos para “burlar” o “registro de encaminhamento” tal como vem sendo arquitetado. E se uma pessoa não “encaminha” a mensagem, mas a partir do conteúdo armazenado em seu dispositivo a reposta? Este registro seria considerado, tendo em vista que a ação foi outra? E se ao invés de encaminhar uma mensagem ou conteúdo visual, alguém printa a tela e reenvia, ou mesmo envia uma “foto da foto”, ou ainda, envia o conteúdo não como imagem ou texto, mas como documento. São meios simples de burlar as “etiquetas”, quer via metadado, quer via hashing que possam ser aplicadas em um sistema de rastreamento de encaminhamentos. 

Como se vê, a exigência do artigo 10 parte de uma premissa equivocada, é pouco eficaz contra as FaKe News e técnicas de subversão possíveis e vai gerar alta onerosidade técnica para os serviços de aplicativos de mensagens, que serão obrigados a ter uma estrutura para gerar e armazenar inúmeros registros de encaminhamentos, taggeando mensagens desde o surgimento dela (inserindo uma codificação para que, eventualmente, diante de uma ordem judicial, seja identificada a “mesma mensagem” compartilhada por mais de 5 usuários), mesmo “sem conhecerem o conteúdo” encaminhado, em um “rastreamento preventivo” perigoso. Aliás, se assim não for, outra questão perturbadora é: Como os provedores de aplicação e mensageria privada vão tecnicamente identificar “uma mesma mensagem”, enviada em massa, se eles não inspecionam o conteúdo das mensagens, por respeito à privacidade e proteção de dados? Farão por hash dos conteúdos (campos)? Desenvolverão uma técnica? Um risco imenso à privacidade se mentaliza. 

Do mesmo modo, a argumentação de que são “apenas” registros metadados e não de conteúdos, e que a criptografia ponta-a-ponta do WhatsApp já preserva a privacidade, também não resiste à análise técnica. A privacidade estará ameaçada mesmo que o mensageiro adote a criptografia das conversas, pois com os metadados gerados por usuários e armazenados pelos mensageiros (incluindo números telefônicos) em mãos erradas ou vazados, pode-se ter um dossiê completo sobre as atividades de encaminhamentos, além de outras correlações, com efeito, existem implicações e conflitos nítidos também com o disposto na Lei Geral de Proteção de Dados (13.709/2018).

Como visto, estes são apenas alguns de muitos pontos nebulosos na disposição o artigo 10 da PL 2.630/2020, como por exemplo, como avaliar a intenção do agente que encaminha uma mensagem considerada Fake? Estaria agindo com dolo ou é mais uma vítima que acreditou e repassou? São pontos como estes que demanda mais debates aprofundados no Senado, que diversamente, não estendeu a discussão para ouvir os especialistas e, rejeitando o destaque de modificação do artigo 10, aprovou o Projeto de Lei. Queremos crer, na Câmara dos Deputados, que o deslinde não seja o mesmo e que a discussão ocorra, no escopo de se corrigir inúmeras falhas deste projeto desproporcional e equilibrá-lo para não afrontar direitos e garantias fundamentais e Leis já estabelecidas, como o Marco Civil da Internet, sobretudo, para que não permaneça com o status de um dos mais restritivos do mundo.

José Antonio Milagre é perito digital, especialista em Crimes Cibernéticos, Advogado, Mestre e Doutorando pela UNESP, Presidente da Comissão de Direito Digital da Regional Vila Prudente da OAB/SP e Diretor do Instituto de Defesa do Cidadão na Internet (IDCI). e-mail: [email protected] 




FACEAPP PERIGO! Como requerer a exclusão dos seus dados! José Milagre – Especialista Crimes Virtuais

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Novo Projeto de Lei das Fake News 3063/2020: 10 pontos que merecem atenção antes de qualquer votação

O que o legislativo brasileiro não pode desconsiderar ao tratar de um PL sobre a possível desinformação na Internet.

Em 02 de junho de 2020 foi apresentado um novo Projeto de Lei que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. A norma projetada destina-se às redes sociais e serviços de “mensageria privada” que ofertam serviços de Internet, com o escopo de desestimular o abuso ou a manipulação destes, dando causa a danos individuais ou coletivos.

Não se aplica ao provedor de aplicação de redes sociais com menos de dois milhões de usuários registrados. Logo, é evidente o foco da Legislação para grandes aplicações como Twitter, Facebook, WhatsApp, Instagram e outros grandes serviços populares no Brasil e mundo, campos de batalha digital em período eleitoral. Sua aplicabilidade também se dá a empresas estrangeiras, desde que haja pelo menos uma integrante do grupo econômico presente no Brasil.

Os objetivos são contemplados no artigo 3 o ., como o fortalecimento do processo democrático com base no combate ao comportamento “inautêntico”, distribuição artificial de conteúdo e fomento à diversidade de informações. Em seu artigo 4º, define o que seria uma conta “inautêntica”, conta essa, criada ou usada com o propósito de assumir identidade inventada ou de terceiros para enganar o público, ressalvados o direito à pseudonímia, bem como o explícito ânimo humorístico ou de paródia. Do mesmo modo, descreve o que seriam “contas automatizadas”, como contas geridas por qualquer programa de computador ou tecnologia para simular, substituir ou facilitar atividades humanas na distribuição de conteúdo em aplicações de internet ou aquelas geridas por ação preponderantemente humana e que complementam a atuação automatizada da conta, ainda que esporadicamente.

A legislação projetada preocupa-se com a criação de “redes de distribuição artificial”, caracterizadas como sendo um comportamento coordenado e articulado de contas automatizadas ou por tecnologia não fornecida pelo provedor de aplicação, com o fim de implantar de forma artificial a distribuição de conteúdos.

No artigo 5º, simplesmente informa que os provedores de aplicação de internet deverão adotar medidas para vedar contas inautênticas, contas automatizadas cujo caráter automatizado não foi comunicado aos referidos provedores. Ainda, em seu artigo 6 o , inclui diversas atividades e deveres para as redes sociais, dentre as quais medidas que demandam levantamento de dados
excessivos e desnecessários para o efetivo combate às Fake News. Chega a anotar como obrigatório relatório com o “número total de redes de distribuição artificial” detectadas. Ora, será preciso uma perícia em informática acurada, e ainda assim, receia-se que será temeroso demais às redes sociais terem que rotular um grupo de perfis como uma “rede de distribuição artificial”.

O usuário passa a ter o direito de ser notificado pela própria rede social, sempre que ocorrer um processo de análise de conteúdos e contas violadoras. Este poderá, nos termos do art. 8º, contestar eventual denúncia de conteúdo irregular. Do mesmo modo, são previstos recursos das decisões, nos termos do art. 9º do Projeto de Lei.

A norma assegura que em caso de conteúdos que tenham sido equivocadamente identificados como irregulares ou violadores dos padrões do provedor de aplicações, caberá ao mesmo reparar o dano, informando o erro de maneira destacada e garantindo a exposição da correção, no mínimo, aos usuários inicialmente alcançados. Caso ocorra a revisão judicial de conteúdo tornado indisponível, assegura em seu art. 11 que a rede social deverá substituir o conteúdo tornado indisponível pela ordem judicial que deu fundamento à correção. Destaca-se que a nova versão do PL veda a indisponibilização de conteúdos com fundamento na própria lei, exceto em casos de decisão judicial.

Interferindo nos serviços de mensagens privadas, o regulamento ainda tenta limitar o número de encaminhamentos de mensagens a usuários e grupos e o número de membros dos mesmos. Diante do art. 14, o Telegram, por exemplo, encontrará um problema no seu modelo de negócios, permitindo grupos com centenas de usuários. O usuário deverá sempre dar permissão
prévia antes de receber uma mensagem de serviço de comunicação em massa nos mensageiros, o que impõe também medidas técnicas por parte de inúmeros aplicativos.

Proíbe-se, no artigo 15, o uso e a comercialização de ferramentas externas aos provedores de aplicação de mensageria privada, voltadas ao disparo em massa de mensagens. Esta questão pode interferir em inúmeros negócios lícitos hoje existentes, macros, automatizadores, chatbots e outros recursos. Muitas ferramentas não tem como fim “o envio” de mensagens em massa, mas possuem a função, para usuários cadastrados e sem qualquer finalidade de espalhe de Fake News.

Percebe-se, por parte do legislador, igualmente, uma tentativa de se “descobrir à fórceps” quem começou uma corrente de possível “Fake News” nos serviços de mensageria privada, uma vez que o artigo 17 estabelece que o provedor de aplicação que apresenta funcionalidade e o reencaminhamento similar de conteúdos, deve guardar os registros da cadeia de
reencaminhamentos até sua origem, pelo prazo mínimo de 1 (um) ano, resguardada a privacidade do conteúdo das mensagens, podendo esses registros ser solicitados mediante ordem judicial nos termos da Seção IV da Lei 12.965 de 2014. A norma, no entanto, não trata explicitamente da proibição de novos compartilhamentos de conteúdos indevidos, a partir da extração de metadados dos arquivos e seu cheksum, medidas aliás determinadas em alguns casos judiciais no país.

Em relação aos conteúdos impulsionados, os usuários passam a ter direitos, dentre os quais, o de saber quais as fontes de informação e quais os critérios utilizados para a definição de público alvo do conteúdo que teve contato. Basicamente, repisando parte do que já era disposto na Lei 12.965 de 2014, a Lei projetada destina sete artigos para tratar da atuação do Poder Público, que deverá incluir capacitação para o uso consciente da internet e deverá realizar campanhas sobre a importância do combate ao comportamento inautêntico na Internet.

As penalidades para o descumprimento estão previstas no artigo 29 do projeto e não excetuam sanções civis, criminais ou administrativas. As penalidades são advertência, multa e suspensão temporária das atividades. Nesta versão, não existe a penalidade de proibição das atividades.

Caberá, ainda, ao Comitê Gestor da Internet do Brasil, definir um grupo de trabalho multissetorial que deverá estabelecer proposta legislativa que conceitue “conteúdo desinformativo”, bem como apresentar as formas de combate a desinformação a partir de boas práticas internacionais em estudo. Este grupo multissetorial teria 1 (um) ano, a partir da publicação da Lei, para apresentar a proposta.

Passa a ser considerada violação à Lei de Improbidade Administrativa o fornecimento de acesso às contas de redes sociais de órgãos públicos à administradores externos ou que não tenham relação contratual com a administração pública, e também o emprego de recursos públicos para condutas que violem a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na
Internet (Art. 11, XI e XII).

Do mesmo modo, a Lei das organizações criminosas (12.850) é alterada para também abranger às organizações formadas para a criação e ou operação de contas inautênticas, contas automatizadas não identificadas e ou redes de distribuição artificial não identificadas por meio do emprego de recursos financeiros e técnicos que praticam ilícitos.

Por fim, a norma exige que as redes sociais e mensageiros nomeiem mandatários judiciais no Brasil, aos quais serão dirigidos os atos processuais decorrentes desta Lei. Feito este resumo dos principais pontos do novo PL, ao qual está se impingindo um ritmo desproporcional à atenção que um projeto desta natureza merece, elencamos 10 (dez) pontos de atenção e consideração, antes de qualquer votação e que demandam esclarecimentos sob pena de consequências gravíssimas:

1) Existe grande risco a aplicativos que não usam contas automatizadas, mas utilizam tecnologias conectadas às redes sociais, uma vez que podem ser consideradas “rede de distribuição artificial”. Como se avaliará a finalidade destes aplicativos? Quem definirá o que realmente é conteúdo artificial? Como as redes farão este papel?

2) As medidas para a vedação de contas “automatizadas” previstas no artigo 5º da legislação são genéricas, não definidas, onerosas e podem implicar na exclusão de conteúdos e perfis legais, isto porque um perfil real ou serviço poderá automatizar alguma tarefa em redes sociais e sem finalidade de praticar desinformação, o que poderá gerar um falso positivo nos registros da rede social.

3) As medidas para a verificação de contas inautênticas já existem hoje em grande parte das redes sociais, porém, não existe o monitoramento prévio, o que é salutar, e somente quando provocado judicialmente os provedores agem em respeito às disposições do Marco Civil da Internet. O Twitter, por exemplo, faz um questionário prévio antes liberar acesso à sua API. Medidas automatizadas poderão implicar em remoções de perfis legítimos, para pesquisas ou autorizados pelas pessoas reais e na limitação de direitos.

4) O relatório de dados que os provedores de aplicação deverão produzir a cada três meses possuem dados excessivos e desnecessários. Como as redes sociais poderão identificar “redes de distribuição artificial”? Qual critério? Qual metodologia e parâmetros para estas conclusões? Como aplicar na prática esta disposição legislativa?

5) Como uma rede social irá lidar com contestações e recursos de pessoas envolvidas em processos de notificação irregular? A rede social passará a julgar conteúdos? Quais as responsabilidades de um julgamento que exclua liberdade de expressão ou opinião? Não se está criando redes policialescas?

6) Como ficará a responsabilidade das redes sociais, a partir da inserção do art. 13 da Lei da Responsabilidade na Internet, quando algoritmos automaticamente reduzirem alcance de conteúdos ou removerem os mesmos? O artigo estabelece que é vedada a indisponibilização de conteúdo com fundamento nesta Lei, exceto por decisão judicial específica e fundamentada.

7) Ao proibir sistemas não oferecidos pelos mensageiros e que permitem o disparo de mensagens em massa, como lidar com serviços legais oferecidos por chatbots por exemplo, onde é possível enviar “broadcasts” aos usuários que optaram por receber os
referidos conteúdos? É possível considerar todos os serviços de disparo em massa como ilegais? E se o usuário concordou com o recebimento?

8) Como estender o conceito de “registros de acesso à aplicação” definidos no Marco Civil da Internet, para englobar também os tais “registros de cadeia de reencaminhamento” previstos na legislação projetada? O que seria este registro? Quais campos o compõe? Estaríamos tratando de data, hora, ip, número telefônico e fuso horário em ordem crescente dos encaminhamentos, desde a primeira publicação no serviço ou mensageiro? Quais os riscos à privacidade dos usuários?

9) Como interpretar um conteúdo desinformativo, se o grupo multissetorial que irá definir seu conceito, terá um ano, após a edição da norma, para defini-lo? Como se produzirá a prova de improbidade administrativa para identificar que agentes públicos cederam a administração de redes sociais a terceiros sem contratos com a administração pública?

10) Como definir “desinformação” de forma clara e justa? Como não tratar usuários de internet como potenciais infratores?

Não há dúvidas que a estas primeiras questões, muitas outras são acrescentadas por associações, entidades de Direito Digital, peritos em informática, cientistas da informação, provedores de aplicações, pesquisadores e sociedade em geral.

Como se verifica, o Projeto de Lei retirado de pauta (2630/2020) trazia uma série de questões polêmicas e exigência de dados excessivos, como documentos de identidade para criação de perfis, além de enaltecer a responsabilização das plataformas, o que confrontava o Marco Civil da Internet e poderia estimular as redes a controlarem conteúdos das redes sociais e ampliar a censura.

Não obstante, a nova proposta, mais amena, também apresenta riscos e pontos que dependem de esclarecimentos e maior tempo de análise, e como concebida, ao obrigar as redes a classificarem e detectarem quem é bot e quem não é, pode gerar um ambiente perigoso e ainda mais nocivo a direitos e garantias fundamentais. Um projeto, com tantos pontos a serem esclarecidos, como o presente, não pode, de forma alguma, tramitar à toque de caixa. Um amplo debate, que enfrente os quesitos aqui levantados, com dilatada participação da sociedade civil, é fundamental. Trata-se, aqui, de um tema sensível a todos, como impactos diretos em direitos e garantias fundamentais. A pressa é inimiga, e poderá culminar em graves consequências à inovação, liberdade de expressão e informação e a outros direitos.




Fomos citados em 3 (três) oportunidades na Manifestação da PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA 154141/2020, em trâmite no Supremo Tribunal Federal – STF

Muito feliz, fomos citados em 3 (três) oportunidades na Manifestação da PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA 154141/2020, assinada pelo Procurador AUGUSTO ARAS, na ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 403/SE, em trâmite no Supremo Tribunal Federal – STF e da relatoria do Ministro Edson Fachin.

O parecer do PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, manifesta-se pela procedência do pedido, para obstar o bloqueio nacional do WHATSAPP como meio coercitivo para cumprimento de decisões judiciais, sem prejuízo de outras providências para cumprimento das ordens judiciais.Feliz em colaborar com o entendimento da corte MÁXIMA sobre o tema!

Para ter acesso ao inteiro teor, acesse: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4975500




Motoristas e trabalhadores de aplicativos podem ser considerados empregados

A exposição dos riscos às pessoas que integram a economia da inovação em tempos de Pandemia (COVID-19) reacendeu as discussões sobre a classificação dos profissionais de aplicativos, como UBER, e traz novos contornos no nascedouro do modelo de negócios que se expandiu para o mundo. 

A discussão sobre o regime jurídico das pessoas que voluntariamente se cadastram em aplicativos para prestação de serviços, de motoristas a freelancers, pode estar sendo impactada e passa a sofrer modificações nos próximos meses, sobretudo por conta da exposição e fragilidade que o modelo de negócios apresentou para a proteção das pessoas que vivem dos serviços prestados através dos aplicativos.

O Estado da Califórnia, considerado um dos mais rentáveis para os aplicativos, iniciou com contundência a revisão deste debate. O Procurador do Estado move uma ação contra a Uber e Lyft para desclassificar os motoristas como contractors (empreiteiros).

Segundo o Estado, os aplicativos classificam erroneamente seus motoristas como “contratados independentes”, o que viola a nova lei trabalhista do Estado, a AB5, que está em vigor desde janeiro de 2020. Essa, dificulta para as empresas no momento de classificarem os trabalhadores como contratados, ao contrário, favorece os motoristas, pois ao serem tratados como empregados possuem direito à salario mínimo e benefícios, como remuneração e seguro desemprego, um direito aliás que não existe no Brasil, até agora, e que veio à tona durante a pandemia do Coronavírus.

O debate sobre o status dos que trabalham por meio de aplicativos não é recente. Inúmeras são as ações judiciais privadas e coletivas discutindo a classificação dos prestadores de serviços. Por outro lado, temos aqui no caso da Califórnia uma Ação do próprio Estado, inédita, que irá gerar um importante precedente mundial, com muitas chances de mudanças significativas nos entendimentos até então consolidados sobre o modelo de negócios versus direitos sociais. 

A Lei trabalhista estadual incorpora um conceito ou método para identificar ou determinar se o trabalhador deve ser classificado como funcionário ou não, denominado “ABC”, usado em outros casos nos Estados Unidos (Dynamex Operations West, Inc. vs. Superior Tribunal de Los Angeles) onde decisões expandiram a definição de funcionário. O teste está ligado a avaliação sobre quem exerce o controle do trabalho. Três perguntas precisam ser respondidas:

  1. O trabalhador está livre do controle e direção da entidade contratante, tanto no contrato como nas atividades em si?
  2. O trabalhador executa atividades que estão fora das atividades e negócios da entidade contratante?
  3. O trabalhador costuma estar envolvido em outro negócio independente, da mesma natureza que o trabalho realizado para a entidade contratante?

A questão é controversa pois à medida em que a Lei Estadual se torna mais protetiva aos profissionais, no âmbito federal, cartas de opinião facilitam a classificação dos trabalhadores como contratados independentes de acordo com Fair Labor Standards Act.

Não é demais destacar que foi o Estado da Califórnia um dos pioneiros a legalizar e permitir este modelo de negócios, e hoje, vem revendo seu posicionamento e buscando nova classificação, em tempos de COVID-19. O Estado representa a maior fonte de receita da Uber e Lyft. Lá, já existe uma campanha pública dos aplicativos para buscarem se tornarem isentos à legislação. Por outro lado, algumas liminares pretendidas pelos aplicativos foram rejeitadas. 

A guerra também é tributária, já que, classificando “erroneamente” os trabalhadores como contratantes, os aplicativos deixam de pagar significativos impostos ao Estado.  A ação busca, inclusive, a restituição de salários não pagos devidos aos motoristas, multas civis e uma decisão permanente que proibirá as empresas de classificarem os motoristas incorretamente no futuro.  

Uma análise da missão da Uber, que alega que os trabalhadores não podem assim ser classificados pois não participam da missão da empresa, é “inflamar a oportunidade colocando o mundo em movimento”. Bem diferente do que previa em 2018, “A missão da Uber é trazer transporte – para todos, em qualquer lugar”. Com base nesta missão fica evidente que os profissionais do aplicativo são essenciais e conjugam esforços para a missão da empresa.  

No Brasil, no entanto, em fevereiro de 2020 o Tribunal Superior do Trabalho negou vínculo empregatício de um motorista na primeira decisão de última instância sobre o tema. Embora aplicável somente ao caso do motorista, não se descarta a possibilidade da uniformização do entendimento. Com base em uma análise dezenas de vezes mais superficial do que a que vem sendo feita no Estados Unidos, os Ministros brasileiros se embasaram na suposta “prestação de serviços flexível” e “não exigência de exclusividade pela empresa” para afastar o vínculo. Contrariou assim o TST o entendimento do Tribunal Paulista, que em 2018 já havia reconhecido o vínculo. De fato, a autonomia dos trabalhadores, tão pregada pelos aplicativos, não funciona muito bem na prática, sendo que os mesmos devem seguir uma série de regras e até códigos de conduta estabelecidos pelas empresas. Porém destaque-se, esta decisão brasileira se deu quando o mundo não poderia prever o que viria alguns dias depois.  

Agora, com a primeira ação Estatal contra os aplicativos, não há dúvidas que a Uber e outras empresas investirão milhões nesta batalha legal e o resultado impactará em todo o mundo. Para muitos, este modelo jamais deveria ter existido, para outros, um retrocesso no “modelo inovador”.  Seja como for, o fato da propositura da ação estatal fez com que os aplicativos se manifestassem. Ao mesmo tempo em que informam que contestarão a ação, também informam que o momento crítico em que vivemos é, de fato, uma oportunidade para elevar o padrão do trabalho independente se fora trazido pela “economia da inovação”. De que forma? Não sabemos. 

Embora saibamos dos reflexos aos usuários em classificar prestadores como empregados, ninguém questiona que estes milhões de profissionais ficaram desprovidos neste momento crítico, e que a crise gerou uma importante reflexão sobre os direitos sociais nestes modelos de negócios. 

Em meio à crise do COVID-19 estes prestadores de serviços foram reconhecidos como “trabalhadores essenciais” a todos, menos para os aplicativos, que insistem em mantê-los como e independentes. Os riscos a que se expõe são muitos, e não restam dúvidas que algo precisa e, ao que parece, vai mudar. 




Nosso Advogado Especialista em Direito Digital participa de uma matéria para o Ministério da Educação sobre a versão digital do ENEM e a questão envolvendo a segurança da informação

Nosso Advogado Especialista em Direito Digital participa de uma matéria realizada pela Agência rádio mais para o Ministério da Educação sobre a versão digital do ENEM e a questão envolvendo a segurança da informação.

Quer saber mais?

Acesse: https://www.agenciadoradio.com.br/noticias/versao-digital-do-enem-segue-a-mesma-estrutura-de-provas-impressas-pran208729